20 de maio de 2012

Gula

Desperta pelo desvario presente no seu olhar, deixa-se envolver pelas suas formas insípidas e jeito grotesco. Trás as trevas pelas mãos, rasgando desde logo um sorriso no seu rosto com a brutalidade impregnada na convicção dos seus passos. Basta a sua presença para sentir a adrenalina queimar nas suas veias secas, sedenta da emoção que o perigo na sua voz enunciou.
Desnuda-se a fantasia, dando espaço à incorporação da figura. Desenham-se linhas disformes no seu caminho, seguindo com os pés torpes pela sedução da imprudência. Inconsciência. Desfalca o juízo e resiste a imprevisibilidade do seu toque suicída.

Esbanjo-me na noite que o cobre, atenta ao chão que me agarra os pés. Colho a sua ausência em meus braços mortos e deito-a em mantos verdes, precipitando-me pela escadaria acima. Tropeço no silêncio dos seus lábios, demasiado embebida na réstia da sua presença. Recolho a chama e corro, devagar.
Pelos degraus escorrem chamas que chovem do meu peito ofegante, apaixonado pela tristeza que cai de seus olhos cruéis. Sucumbo à tentação nessa bruma ardente, embora cega pela neblina que vai caindo, muda.
No seu cimo estaria ele, imaculado em toda a sua imundice e ousadia, emoldurando-o suas feições delicadas.

12 de maio de 2012

Ócio

Arrasta-se o tempo e com ele a vontade, arrasada pela insignificância que nutre por ela. Reduz-se à poeira que se lhe figura, impávida perante o desfile do seu retrato, uma espectadora de si própria. Consome-a a fadiga do silêncio, enquanto o sopro se passei mesmo à sua cabeceira, sugando-lhe os passos que entretanto se tornaram pesados e desnorteados. Pousa a cabeça, extravasam-lhe os pensamentos vagos, tão presentes e reais quanto os dias que os sustentam. Extingue-se a certeza e assenta-se sua fantasia, consolada pela suposição de uma manhã se encontrarem...